Única no estado e considerada referência no Brasil, a Unidade de Treinamento para Desospitalização (UTD) do Hospital Martagão Gesteira completou, nesta segunda-feira, 25, oito anos desde a sua criação. Nesse período, o setor possibilitou que 123 crianças portadoras de doenças crônicas pudessem retornar para seus lares, sem terem seus tratamentos interrompidos.
Essa conquista só é possível porque a UTD é um setor do hospital que treina os próprios familiares dos pacientes para serem também cuidadores dos seus filhos. Na maioria dos casos, são as mães que ocupam essa função.
“São pacientes com longo tempo de permanência em UTIs e que passam a poder retornar para seus lares mesmo precisando de aparelhos para sobreviver. As mães e pais são treinados durante meses para poderem dar continuidade à assistência dessas crianças, que permanecem sendo acompanhadas pelo hospital, quando residentes em Salvador e Região Metropolitana”, explica a enfermeira líder da UTD, Nilveci Nascimento.
“Quando tudo começou, parecia um projeto quase que impossível de ser realizado, mas, a cada ano, fomos transformando nossa intenção em realidade e nos aprimorando. Hoje, oito anos depois, podemos ver que estávamos no caminho correto e ajudamos a transformar a vida dessas famílias e queremos transformar a de muitas outras”, ressalta o presidente da Liga Álvaro Bahia Contra a Mortalidade Infantil (entidade mantenedora do Martagão), Carlos Emanuel Melo.
Mãe de João Miguel, de apenas um ano e 11 meses, Marli dos Santos conta que seu filho chegou na unidade pesando quatro quilos. “O tratamento no Martagão é 100%. Todos os profissionais tratam meu filho com excelência. Houve muita melhora no quadro do meu filho. Ele não respirava direito. Hoje, já está pesando oito quilos”, relata.
Criada em 25 de maio de 2012, a UTD foi idealizada pelo próprio Martagão, em parceria com a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab), com o objetivo de dar treinamento para cuidadores de crianças em condições de doenças crônicas e dependentes de tecnologias avançadas, como os casos daquelas que dependem de ventiladores mecânicos para sobreviver.
“Inicialmente, as crianças que estavam ocupando leitos de longa permanência em UTIs foram captadas para o Martagão após uma avaliação de elegibilidade. A partir daí, foi feito o treinamento desses cuidadores para que elas tivessem a oportunidade de retornar para seus domicílios”, acrescenta Nilveci.
Com 20 leitos, a UTD recebe crianças de todo o estado, que são encaminhadas via Central Estadual de Regulação. Em todos os processos, é feita uma avaliação do paciente para verificar se ele está num quadro estável de saúde, que permita esse retorno para casa, o que pode ocorrer no período de um mês a um ano. As mães praticamente também moram no hospital porque têm que acompanhar seus filhos até que eles possam ser reintegrados no ambiente familiar e social.
“O tempo para treinar os cuidadores e desospitalizar a criança varia muito. Depende de vários critérios, como o processo de alta, a aceitação do município de origem, entre outros”, destaca a enfermeira.
PAVD – No caso das crianças que não conseguem ser referenciadas para seus municípios de origem, se a família conseguir se manter financeiramente em Salvador, elas são inseridas no Programa de Atendimento Ventilatório Domiciliar (PAVD) do Martagão. “Uma parte da equipe multidisciplinar do próprio hospital faz visitas domiciliares e presta os cuidados e assistência às crianças em seus domicílios”, diz Nilveci.
No PAVD, o Martagão fornece os materiais de uso, como insumos e equipamentos. Há casos, ainda, em que, por meio de doações, o hospital consegue viabilizar o aluguel de um imóvel para a família do paciente que fica em Salvador, o chamado aluguel solidário. “A UTD vai muito além de apenas fornecer assistência. Há todo um envolvimento social, que tem continuidade como o PAVD. Montamos uma estrutura em domicílio, com berços, camas e disponibilizamos a equipe multiprofissional para fazer o acompanhamento”, destaca a diretora do Martagão, Erica Oliveira.
Há casos em que os cuidadores não são alfabetizados e os profissionais de saúde precisam criar prescrições e instruções adaptadas para que possam administrar os medicamentos dos filhos com segurança. “É um trabalho árduo, feito em conjunto e contínuo, mas com muito amor e carinho. No final, a gente consegue perceber que é possível o retorno desses pacientes para seus domicílios. Viver em hospital não é vida. Desospitalizar é fundamental para que essas crianças possam voltar para casa”, finaliza Nilveci.