Engana-se quem pensa que a vaga ocupada por um parente numa empresa familiar pode ser mantida sempre com facilidade, apoiada nos laços de afeto e de consanguinidade. Claro que isso ainda acontece, mas o certo é que muitas empresas familiares já despertaram para as exigências do mercado e vêm investindo numa gestão profissionalizada em busca de conciliar a presença de familiares em cargos importantes e a entrega de resultados compatíveis com as funções executadas.
Quem nunca conheceu ou ouvir falar, por exemplo, de um profissional que estaria ocupando um cargo por indicação familiar mesmo sem estar habilitado para exercer tais funções? Se por um lado essa prática de “passar a mão na cabeça” ainda tem adeptos, por outro exige atenção de quem está inserido nela, pois pode estar com os dias contados.
A advogada Marta Gomes, sócia do escritório especializado em direito empresarial Gomes Martins Advogados &Consultores, aponta o nível de profissionalização abaixo do recomendável e a forte tendência à centralização das decisões motivada pela dinâmica familiar como fatores que têm causado impacto nos resultados de empresas familiares.
Como resposta a uma realidade que bate à porta e alerta para um mercado cada dia mais competitivo, tais empresas vêm lançando mão de ferramentas de gestão disponíveis e que não são poucas. ”Há um leque de ferramentas – no âmbito jurídico – que podem ser muito úteis e envolvem desde a revisão do contrato social ou estatuto, formatação de acordos entre sócios até criação de órgãos consultivos e instituição de políticas internas, dentre outras medidas”.
A profissional inclusive esclarece que a classificação como familiar não se aplica a todas as empresas pelo simples fato da presença simultânea de parentes. “A chegada da segunda geração de gestores e a preponderância do parentesco como critério de escolha daquele que irá suceder na gestão são os fatores que determinam o enquadramento de uma empresa como familiar“.
Sucessão – No quesito que se refere à sucessão reside uma das principais questões relacionadas à sobrevivência da empresa, já que nem sempre a melhor escolha recai sobre um familiar. “Quando os aspectos familiares preponderam na administração da empresa, normalmente, podemos especular que ali há uma gestão centralizadora, que acaba não preparando o ambiente para sucessão, podendo denunciar disputa ou favoritismo entre herdeiros, falta de profissionalismo na contratação de funcionários que são parentes, dentre outros problemas”, pontua Marta Gomes.
O certo é que as empresas – de um modo geral – já enfrentam inúmeros obstáculos e, quando as dificuldades típicas do empreendimento se somam àquelas vinculadas à família, a situação pode ficar mais crítica. Por isso, a saída tende a ser a profissionalização da gestão, sem que essa medida seja encarada como um acessório de luxo, mas,sim, de sobrevivência.
Empresa como soberana – A consultora e sócia-diretora geral da GPS Desenvolvimento Humano e Empresarial, Fátima Cunha, realça que todo o trabalho realizado para profissionalizar a gestão de uma empresa familiar passa pelo princípio de que a confiança afetiva não pode se sobrepor à confiança moral, conceitual e profissional,no modelo de gestão de sucessão e no rumo das decisões da corporação.
“Acima das pessoas, a soberania está na organização. Aos membros da família, não pode ser negada a oportunidade de integrar o quadro da empresa, mas a conquista de determinado cargo deve se dar pela via da competência para assumi-lo, sempre tendo em vista os resultados que estão no plano de metas da corporação”, realça a profissional, que ainda lembra: “Quanto menor a empresa, maior o impacto de uma gestão familiar deficiente”.
Se a intenção é optar por condutas afinadas com uma gestão profissional, a consultoria empresarial é uma alternativa com grande margem de acertos. Ela funciona, por exemplo, para diagnósticos empresariais quando o que se busca é fazer uma avaliação de desempenho e de resultado das diferentes áreas da organização. Desta avaliação podem ser detectados os pontos de melhoria na conduta e adequação de perfis dos colaboradores para determinados cargos.
Entre as ferramentas utilizadas por uma consultoria estão os planos estratégico e executivo, acompanhamento e avaliação sistemática de resultados e o plano de cargos e salários adequado ao modelo de gestão. “Trabalhamos com a ideia de que cada líder na empresa tem um programa de ação, e esse programa é pautado nos resultados que essa pessoa deve gerar”, resume Fátima Cunha.
Humana sim, emotiva não – O LPC Laboratório e Vacinas é um exemplo de empresa familiar profissionalizada. “Isso significa que os papéis dos membros da família estão bem definidos, sendo acompanhados regularmente e com entrega de resultados”, esclarece o diretor executivo da organização, Jaime Lima.
Hoje ocupando um cargo que já foi do seu pai, Jaime não vê como prejuízo para a gestão organizacional o fato de cargos importantes serem ocupados por membros da família, desde que esses profissionais tenham competência, formação e entreguem resultados. “Esses requisitos sendo atendidos, a relação parental pode até ser um ponto positivo, pois fortalece o espirito de dono na cultura empresarial”, reforça.
O empresário aponta o grau de emotividade nas relações como outro cuidado que deve ser tomado. “A empresa tem que ser humana, seja nas relações entre familiares ou com outros profissionais, mas não pode ser emotiva. Deixar que a emoção se sobreponha à razão é um ponto bem negativo, ainda mais quando se trata da relação entre parentes à frente de uma organização”, realça Jaime Lima.